Artigo- O longo caminho para a recuperação: desafios e perspectivas da agricultura gaúcha pós-enchentes
O
Rio Grande do Sul, tradicional celeiro do Brasil, enfrenta um de seus maiores
desafios. As enchentes recentes não devastaram apenas cidades e estruturas
físicas, mas atingiram silenciosamente o que há de mais vital para a economia
rural: o solo produtivo. Regiões como o Vale do Taquari e a área de Santa
Maria, conhecidas por sua fertilidade, viram terras aráveis construídas com
esforço e técnica serem levadas ou soterradas por sedimentos inférteis.
Solos
férteis levam até dois séculos para se formar. A camada superficial, rica em
matéria orgânica e microrganismos, é o motor da produtividade agrícola. Perder
essa camada é retroceder décadas, ou séculos, de trabalho baseado em práticas
como rotação de culturas, plantio direto e cobertura verde.
A
reconstrução das áreas afetadas exigirá investimentos significativos e ações
urgentes. Entre as prioridades estão a recomposição das áreas degradadas, a
reconstrução de sistemas de irrigação e drenagem, a reposição de insumos
perdidos, o acesso a crédito rural facilitado e a liberação rápida de
indenizações e seguros agrícolas. Além disso, será indispensável um diagnóstico
técnico detalhado dos solos, com assistência continuada de agrônomos e
especialistas para orientar a recuperação.
O
papel do agricultor, com seu conhecimento prático e dedicação, será fundamental
nesse processo. No entanto, sem apoio, milhares de famílias rurais correm o
risco de não conseguir retomar suas atividades. A perda da capacidade produtiva
representa não só renda zero ou reduzida, mas também maior endividamento,
insegurança alimentar, êxodo rural e impactos emocionais profundos.
Os
efeitos das enchentes vão além do campo. A queda na produção de grãos, frutas,
hortaliças e forragem afeta toda a cadeia produtiva, pressionando o
abastecimento, elevando preços e prejudicando o consumidor. Indústrias,
comércios e serviços ligados ao agronegócio já enfrentam perdas. O impacto no
PIB estadual e na arrecadação pública também será significativo, com reflexos
na geração de empregos e nos investimentos sociais.
A
recuperação da agricultura gaúcha não será imediata. Trata-se de um esforço
coletivo de longo prazo, que exigirá união entre governos, setor privado,
universidades, entidades de classe e, sobretudo, da comunidade rural. Mais do
que reconstruir estradas e estruturas, será preciso restaurar a fertilidade do
solo e a dignidade de quem vive da terra.
Jeferson Ferreira
Presidente do ITAQE (Instituto de Tecnologia Agrícola, Qualificação e Estudo)
www.itaqe.org.br
Comentários
Postar um comentário